25 de setembro de 2011

Centro d'Italia – La Citta di Rieti.

Eu já tinha ouvido falarmuito sobre este lugar antes de embarcar no aeroporto de Gatwick [Londres] e descer no Fiumicinno [Roma], pegar um trem na estação do aeroporto e desembarcar no final da linha, em Fara Sabina. Dali foi só pegar um ônibus da Cotral [estatal italiana], na rodoviária em frente à estação e, em aproximadamente 45 minutos, chegar ao Centro d'Italia – La Citta di Rieti.


A primeira impressão que eu tive, por ter sido acomodado em um bairro residencial afastado, foi que tratava-se de uma cidade interiorana, com uma arquitetura sem expressão alguma, somente desenhada para ser prática e anti-sísmica, aos pés de uma montanha onde alguns turistas e familias locais iniciam-se nos esportes de inverno, hospedados nos poucos hotéis e frequentando as estações de ski no monte Terminillo.


Riete faz parte da região-terra natal da minha família paterna e o objetivo da minha vinda foi viver a saga da cidadania italiana. Eu dei entrada na documentação e entrei em um curso de italiano para passar o tempo, sair daqui fluente e, aos poucos, fui ganhando conquistando cada objetivo, aprendendo a comunicar-me, tornando-me independente e conhecendo pessoas que viriam a tornar-se grandes amigos. Percebi que tesouros históricos desenhavam a região, cheia de conteúdo e preservada por uma aristocracia remanescente, que insiste até hoje em proteger o seu estilo de vida, com uma visão talvez fascista demais, mas que revela uma cultura espetacular, desde uma rica gastronomia até elevadas expressões em termos artistícos, poético, sócio-políticos, econômicos e religioso – o que atrái italianos de outras regiões, fazendo dos reatinos um povo único, próspero e orgulhoso das suas conquistas milenares, pois até residência oficial do papado Rieti já foi e os fundadores de Roma, segundo uma lenda, também sairam destas terras.


Eu não tenho a intensão de percorrer a história da cidade ou ser um guia turístico aqui no blog, mas indico um livro que ganhei e me ajudou muito a conhecer os reatinos e visitar toda a região - “Rieti. Santuari francescani. Itinerari tematici.” - A autora, Rita Giovanelli, é uma figura sensacional, pois além de publicar o guia da cidade, tem outros trabalhos literários para o público infanto-juvenil e outro guia voltado so para a cidade subterrânea da era medieval. É também artista plástica, guia de turísmo pela cidade no verão e desenvolve projetos públicos dentro do setor em que atua. Tem também um “residence”, onde eu morei por alguns meses e recomendo para quem estiver a fim de passar por aqui . Falo tudo isso porque a conheci pessoalmente, pude acompanhar o seu trabalho e estou morando em um dos seus flats, os quais ela também administra – uma verdadeira embaixatriz da cidade.


A rotina da cidade é tranquila, nada de trânsito, sujeira ou poluição. É repleta de fontes de água fresca e potável, espalhadas por todo o centro, bairros e vilarejos, o que já me fez ficar boqueaberto com tudo aqui, pois sou viciado em água.

Por volta das nove da manhã os Cafés/Bares começam a abrir e um a um vai chegando nos balcões pedindo um café expresso, ou um cappuccino, macchiato, latte, entre outros muitos. Eles mesmo se servem de um sonho com creme [iguais aos do Brasil], danishes com geléias, ou os famosos “cornetti” [aqui, croassant chama-se cornetto]. Eu, particularmente, curti muito o cornetto con nutella ou con la crema – é uma briga para não ficar sem um desses neste horário.


A Via Roma, principal endereço comercial de Rieti, começa a ver as portas das das suas lojas de roupa, decoração, perfumaria, tabacaria, salão de estética, livraria, atelies, botiques e até um chinezinho cult bem frequentado e uma loja de armas para caçadores meio exótica, por volta das 10. Dependendo do humor ou sono de seus proprietários. É muito comum ver um comércio fechado aqui e outro ali, ou porque tirou uns dias de férias, ou porque resolveu chegar mais tarde. Os cidadãos aparentemente entendem tal postura e todo mundo é feliz assim.

Entre um caminhão descarregando mercadoria em uma porta, baristas desfilando com bandeijas e xícaras, fazendo entregas de café nos escritórios, cachorrinhos sendo levados para passear e estrangeiros recém-chegados andando meio que perdidos, a cidade começa a acordar e a praça central – Piazza Vittorio Emanuele II – fica cheia de servidores públicos e profissionais, executivos e alguns turistas, pois ali estão os orgãos públicos mais importantes da província, a rádio local, os cafés tradicionais, a maior agência de correspondências, o teatro municipal, alguns palacios, fontes, igrejas e as principais agências bancárias, joalherias e uma banca de jornal show de bola, que me lembra muito as de São Paulo.

Geralmente eles chegam as 9 em seus trabalhos, batem seus cartões e saem para tomar o café e fumar – é um povo que fuma muito. As 10 a movimentação já acabou, todos já subiram para trabalhar e só saem para almoçar e dormir, das 12 as 16, quando voltam para os seus postos e vão até as 18 horas. Entre um aperitivo e outro, a cidade vai ficando vazia novamente, os restaurantes, tratorias e pizzarias enchem, a praça passa a ser ocupada pelos jovens que vão se encontrar ali e, aos poucos, o vazio vai tomando conta e a cidade dorme.

Nos finais de semana Rieti é cheia de eventos, tanto no inverno, no Terminillo, quanto no verão, com esportes aquáticos no rio Lungo Velino, campeonatos de ciclismo, corrida, feriados religiosos, festivais e feiras artesanais, de antiguidades, gastronomicas, de música e partidarias, além das famosas piscinas, que abrem e ficam cheias diante de temperaturas na faixa dos 35 graus.


Confesso que a cidade tem muito mais a oferecer, porém, como não tive tempo o suficiente para viver tudo, fica aqui a dica para que vocês descubram por si próprios o que há de melhor nas montanhas italianas. Eu aproveitei cada momento dos meus 7 meses por aqui, entre idas e vindas a Roma, andei por vilarejos como Greccio, Amatrice, Citta Reale, Borgo Quinzio e Turano e visitas a amigos que vivem em espalhados pelos campos.


Rieti e seu povo certamente ficarão para sempre no meu coração, pois aqui derramei muitas lágrimas, vivi a dor de uma separação seguida de divórcio, fui levado aos meus limite de paciência, espera e recursos, minha fé foi colocada a prova e convivi diplomaticamente com pessoas que entram na minha vida sem eu desejar. Foi a cidade que testemunhou o meu renascimento como sonhador, como buscador de experiências únicas, como homem livre que sempre fui e havia me esquecido como era ser e, principalmente, foi cenário de um tempo onde vi quem são os meus amigos, descobri que tenho uma família linda, que me respeita e me ama, que cuidou dos meus interesses, ajudou nos meus problemas e me fortaleceu quando eu precisei. Fiz também amigos espetaculares, como um grupo de refugiados do Afeganistão, uma familia exilada da Tunísia, dois irmãos sheikes do Líbano, um italiano restaurador de móveis e talhador em madeira, uma italiana professora de línguas, que me ensinou a falar melhor italiano, um casal que tem uma princesinha linda, Gioa, que me hospedou por 4 meses, um brasileiro de Santos, que me ensinou a fazer “Linguine alle Vongole Veraci” e “Pasta alla Norma”, com beringela, molho de tomate e ricota salata.


São pessoas, acontecimentos, historias e lugares que, aos poucos, foram me moldando, me restauranto, me transformando em um legítimo italo-brasileiro reatino e paulistano. Sou muito grato a tudo e quero expressar respeito, gratidão, amizade e saudades às pessoas e ao tempo bem vivido que tive aqui na terra do meu pai, avô, dos Iorios do centro da Itália.

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